terça-feira, 22 de junho de 2010

POLÍTICA DE MEDICAMENTOS - MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS

POLÍTICA DE MEDICAMENTOS - MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS




A expressão/denominação medicamentos excepcionais originária de uma forma de procedimento de aquisição, qual seja: medicamentos de aquisição em caráter excepcional, tem sido motivo de interpretações equivocadas do ponto de vista da farmacologia, da utilização e de programas de governo. Inclusive, sendo discutida e rejeitada pelos profissionais atuantes nos programas de assistência farmacêutica, no país. Portanto, para este trabalho, foi utilizado o conceito implícito na Portaria MPAS/MS/MEC nº 03, de 15 de dezembro de 1982:

Medicamentos denominados excepcionais, de dispensação em caráter excepcional ou de alto custo, são aqueles medicamentos cuja aquisição, governamental, é feita em caráter excepcional, individual, e com recursos financeiros independentes daqueles destinados aos medicamentos da RENAME, utilizando critério especial para dispensação.

V.1. Histórico

A prestação de assistência farmacêutica sob a forma de programa, mas de financiamento individual, se dá, pelo menos, desde a criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs) pela Lei Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24/01/23. A "venda de medicamentos a preços especiais", entre outros benefícios, foi definida como atribuição obrigatória das instituições previdenciárias. "Os serviços farmacêuticos consistirão no fornecimento de medicamentos pelo menor preço possível, nunca abaixo do custo, inclusive manipulação e transporte" no Decreto nº 21.081/32 e "socorros farmacêuticos, mediante indenização, pelo preço do custo acrescido das despesas de administração" no decreto do Instituto de Aposentadoria e Pensões da Marinha-IAPM de 1933 (Oliveira, 1986: 68), são exemplos de como a assistência farmacêutica institucional se manteve, ao longo dos anos, associada aos recursos da Previdência Social, enquanto os programas para tratamento das doenças endêmicas sempre estiveram sob custeio do MS.

Posteriormente, a prestação da assistência farmacêutica pela previdência social, ainda exclusiva aos beneficiários do sistema, era feita por doação ou com financiamento parcial ou total, descontados em folha de pagamento, e o objetivo principal era garantir o retorno ao trabalho. Tais revendas eram feitas pelas drogarias do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), sindicatos ou empresas conveniadas (Brasil, 1967).

A criação do INPS significou a montagem de uma imensa, intricada e insulada burocracia (...). Sustentada pelos substantivos recursos das contribuições, passou a servir de arena privilegiada para o intercâmbio de favores clientelistas e arranjos fisiológicos entre burocratas e políticos (Labra, 1993:203).

Em 1971 é criada a CEME para coordenar a política de assistência farmacêutica governamental, e no Plano Diretor de Medicamentos se prevê a manutenção de estoques de medicamentos importados e utilizados em doenças de rara incidência (Brasil,1973). A CEME é vinculada ao MPAS, em 1974, e a partir da portaria MS/GM no 233/75 fica estabelecida sua responsabilidade nas ações de aquisição e distribuição dos medicamentos utilizados pelas instituições vinculadas ao MPAS e entidades com elas conveniadas. Esta portaria permite a aquisição de produto fora da padronização, quando houver justificativa, mas, necessariamente, similar terapêutico ao da RMB, o que difere do medicamento excepcional, cuja aquisição independe da padronização de medicamentos básicos ou essenciais e de similaridade.

A partir da segunda metade da década de 70 a assistência farmacêutica do MPAS é expandida, sendo criadas desde Coordenação até Unidades de Assistência Farmacêutica (UAF), de acordo com a hierarquia vigente. Com a expansão do sistema e posterior universalização dos benefícios pode-se imaginar o volume de recursos envolvidos e os interesses da indústria farmacêutica no setor público.

As revendas de medicamentos feitas pelas drogarias do INPS, sindicatos ou empresas conveniadas duraram até 1975. Em 1976, este sistema foi sendo desativado e substituído a partir da assinatura de convênio com a CEME. Entre 1975 e 1977 conviveram os dois sistemas, CEME e revenda, sendo este último desativado no final de 1977 (Wilken & Bermudez, 1999: 20).

Em 18 de outubro de 1976, é homologada a primeira Relação de Medicamentos Básicos, através da Portaria MPAS/GM nº 514, e não a no 817 como se tem apresentado na literatura, até agora. Esta relação apresenta 300 medicamentos em 535 apresentações. Nesta relação já consta o imunossupressor Azatioprina que viria a ser incorporado à lista de excepcionais em dezembro de 1999.

Cabe destacar que na Portaria MPAS/GM nº 817/77, que foi uma revisão da 514/76, consta o medicamento Sulfasalazina, comprimido de 500 mg. Em 1980, além de mantido na homologação da RENAME, ainda são incorporados o Ferro Coloidal, sol inj., amp. 2 ml, 50mg/ml e Hormônio do Crescimento. Esses medicamentos vão, posteriormente, fazer parte da relação de medicamentos excepcionais, mesmo constando da RENAME.

A ampliação da assistência farmacêutica com medicamentos da CEME para hospitais, aumento do elenco de dispensação e compra para ambulatórios conveniados foi o que permitiu o primeiro espaço para a entrada dos excepcionais na dispensação:

A brecha para medicamentos excepcionais foi uma associação que procurava atender os portadores de nanismo hipofisário. Esta associação tinha contatos com endocrinologistas do INAMPS, que queriam tratar os pacientes, mas não havia o hormônio do crescimento que era de alto custo. Esta questão foi levada à direção do INAMPS que decidiu incluir no convênio com a CEME (Entrevista 1).

A CEME celebrou, em 1976, contrato com a Universidade de Brasília para realização do projeto "Otimização do Processo de Isolamento e Purificação do Hormônio do Crescimento Humano", utilizado no tratamento do nanismo hipofisário por ser de alto custo e de produção mundial insuficiente (CEME, 1976). Esse projeto foi concluído em 1978 e o relatório final da equipe do laboratório de Bioquímica do Departamento de Biologia Celular da Universidade de Brasília apresentou sucesso, já que duplicava o rendimento do método extrativo até então utilizado. A produção interna, em escala industrial, passou a depender de atualização da legislação sobre utilização de órgãos humanos e articulação dos ministérios da Justiça, Saúde, Previdência e Assistência Social e da Indústria e Comércio (CEME,1978). Em final de 1979, estavam sendo desenvolvidos entendimentos, entre a CEME e a Secretaria de Saúde do Distrito Federal, para aproveitamento dessa produção. Entretanto, o financiamento dependia de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (CEME,1979).

Foram previstas uma rede de coleta de hipófise, para a produção do hormônio pela Fundação Universidade de Brasília, e a produção de 14.000 ampolas a custo muito inferior ao do importado (CEME,1980).

Em 1982 foram importados pela CEME 15.000 frascos-ampolas de Somatotrofina (Crescormonâ ) e 3.000 ampolas de Asparaginase (CEME, 1982).

A CEME considerava a tecnologia de produção desse hormônio integralmente desenvolvida, no Brasil. Considerava, ainda, que sua produção era prioritária, já que o custo médio do tratamento, por paciente, ultrapassava US$ 15 mil, por ano, inviabilizando um atendimento amplo pelos serviços de assistência farmacêutica governamental. Estava em execução o repasse de tecnologia para a implantação de unidade produtora de hormônio pela Fundação Ataulpho de Paiva, com as expectativas de produção em larga escala e a custo substancialmente inferior (CEME,1983; 1984).

Em 1988, o programa de distribuição de Hormônio do Crescimento (Human Growth Hormone-HGH) estava interrompido e a Coordenadoria de Administração de Atividades de Farmácia, em relatório ao Presidente do INAMPS, sugeria investir na produção nacional pela Fundação Estadual Ataulpho de Paiva que possuía a tecnologia de extração do hormônio desenvolvida pela Universidade de Brasília (Wilken,1988).

O HGH foi um dos primeiros medicamentos a serem adquiridos como excepcional dado ao seu alto custo e necessidade de importação. A partir daí, surgiram outras demandas, como L-Asparaginase para leucemia e Ciclosporina para transplantados.

Com isso cresceu substancialmente a demanda, e uma forma de controle foi a criação de processo individual, pois antes o medicamento ia para o hospital de referência e o controle era feito através do protocolo médico. No início, as compras se davam a partir do protocolo médico, passando posteriormente a serem feitas através de processo, individualmente, para medicamentos diversos, mas de alto custo, o que levou à enorme burocracia e dificuldade de controle (Entrevista 1).

Em junho de 1982 o INAMPS constituiu comissão para estabelecer diretrizes para coordenar a execução do tratamento com o HGH. Essa comissão foi reformulada em dezembro/87 para restabelecer esses objetivos.

A CEME investiu em pesquisa na produção do hormônio, mas apesar dos resultados positivos quanto à produção, havia o problema da utilização de órgãos humanos. Atualmente o produto ainda é importado. A notícia mais recente é que o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) assinou convênio com a Hormogen Biotecnologia para produzir e comercializar o HGH (Súmula,1999).

Considerando como um marco para o estudo dos medicamentos excepcionais, a Portaria Interministerial MPAS/MS/MEC nº 03, de 15 de dezembro de 1982, regulamenta e estabelece a RENAME como definidora dos produtos farmacêuticos prioritários para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento das doenças prevalecentes na população brasileira e delega à CEME a competência para promoção de estudos para atualização periódica da RENAME. Estabelece, ainda, a adoção da RENAME pelos órgãos públicos conveniados e normas para fornecimento gratuito de medicamentos. O item 3 e os seus subitens 3.2 e 3.3, desta portaria, abrem a exceção de aquisição de medicamentos não constantes da RENAME.

3.2 - Em caráter excepcional, os serviços prestadores de assistência médica e farmacêutica poderão adquirir e utilizar medicamentos não constantes da RENAME, quando a natureza ou gravidade da doença e as condições peculiares do paciente o exigirem e desde que não haja, na RENAME, medicamento substitutivo aplicável ao caso.

3.3 - A prescrição excepcional de que trata o subitem 3.2 será obrigatoriamente objeto de justificativa, a ser apresentada, por escrito, pelo médico assistente do caso, e homologada, a posteriori, pelo órgão de auditoria médica da instituição prestadora do atendimento.

A portaria também estabeleceu, para aquisição direta de medicamentos excepcionais, o destaque de até 15% do valor global de recursos financeiros destinados à compra de produtos da RENAME, por cada ministério.

A prestação de contas dessa modalidade de aquisição, no INAMPS, era feita pelas unidades através de notas fiscais, com recursos do suprimento básico, obedecendo critérios específicos de justificativa da necessidade e comprovação (Brasil, 1984). De acordo com técnico do MS, e mesmo através de pesquisas junto às bibliotecas desse ministério no Rio de Janeiro, Brasília e relatórios da CEME, não foi possível levantar dados sobre os gastos com medicamentos excepcionais ao longo desses anos. Atualmente, os valores a partir de 1997 estão disponíveis na rede Internet, página do MS, e cabe destacar que estão embutidos nos gastos dos medicamentos excepcionais os gastos com os mesmos medicamentos quando utilizados em oncologia.

A partir da homologação da RENAME (dezembro de 1982), o INAMPS, através de várias Ordens de Serviços (OS), estabeleceu diversas normas visando organizar sua assistência farmacêutica, entre elas, a criação de comissões de farmácia e terapêutica e a padronização de medicamentos, tanto para unidades próprias como para entidades conveniadas.

Com a passagem da CEME para o MPAS, em 1974, o INAMPS passa a ser o seu maior comprador. De 1976 a 1984, o INAMPS era a maior fonte de receita, representando, em 1980, 79,2% do total de receitas da CEME (CEME, 1980).

Em média, para o período 1972-1989, a Previdência foi responsável por 43,7% da receita, o Tesouro 34,4% e o restante (21,9%) distribuído por outras receitas (Médici, 1991: 42; 50).

Em outubro de 1986 é instituída, pela OS nº 121, a Relação de Medicamentos Padronizados (RMP) do INAMPS com 59 apresentações de medicamentos, destinada a complementar a RENAME, para uso exclusivo em sua rede hospitalar. Entre as justificativas para a resolução está a rotina de aquisição direta de medicamentos não constantes da RENAME e os preceitos da excepcionalidade constantes na Portaria Interministerial nº MPAS/MEC/MS 03/82. Nesta padronização já foram incluídos os atuais medicamentos excepcionais: Calcitriol 0,25 mcg, Ferro Coloidal sol. inj., amp. 2 ml, Danazol 100 mg, Ciclosporina sol. oral e Penicilamina 250 mg.

O mercado governamental de medicamentos representava, em 1986, 35% do mercado total, ou seja, US$ 630 milhões. É importante ressaltar que 57% desse mercado governamental correspondia à utilização de medicamentos fora da padronização representada pela RENAME, adquiridos diretamente pelas diferentes instituições contratadas pelo INAMPS para prestação da assistência médica à sua clientela (CEME, 1987).

Nessa época, a participação da CEME no suprimento de medicamentos para programas assistenciais do governo era menor que 50%. O suprimento de medicamentos do INAMPS era aproximadamente assim distribuído: 30% do receituário de produtos fora da RENAME, 30% adquiridos da CEME; e 40% medicamentos constantes da RENAME, mas não supridos pela CEME (Vaitsman, 1991: 189; Lucchesi, 1991: 268).

Esse período era de grande debate político e de expansão das Ações Integradas de Saúde (AIS). Apesar de êxitos localizados em alguns municípios, as AIS não foram capazes de combater o paralelismo de ações, a multiplicidade gerencial e a centralização do poder decisório no âmbito federal. Assim, o desenvolvimento das AIS como nova alternativa para organização dos serviços de saúde esbarra na diretriz da descentralização plena, já que a representação federal nos estados (Superintendências Regionais do INAMPS) permanece exercendo poder amplo, centrado, principalmente, no "monopólio" do relacionamento com o setor privado (Noronha & Levcovitz, 1994: 86).

Através da OS/INAMPS/SMS nº 134 de 1987 foram estabelecidas normas para a aquisição de medicamentos nas Superintendências Regionais do INAMPS. As justificativas desta portaria foram: o aumento da demanda, múltiplas formas de atendimento pela assistência farmacêutica do INAMPS e necessidade de se estabelecerem critérios para atender a descentralização e regionalização dos serviços de saúde.

A portaria estabelecia que a aquisição de medicamentos do consumo interno ambulatorial e hospitalar constantes da RENAME só poderia ser efetuada diretamente pelos hospitais e Superintendências Regionais quando, comprovadamente, não existissem estoques nas Centrais Distribuidoras de Medicamentos (CDM) do INAMPS, ou em caráter complementar à distribuição dos produtos programados junto à CEME, FURP ou outros convenentes para compra de medicamentos, de acordo com Decreto-Lei nº 2.300/86. Em caso de necessidade imediata, a compra poderia ser feita pelo Suprimento Básico.

Para atendimento hospitalar poderiam ser adquiridos medicamentos não incluídos na RENAME ou RMP sob justificativa clínica e através de recursos do Suprimento Básico.

A aquisição de medicamentos excepcionais para tratamento ambulatorial, mediante requerimento, laudo e receituário médico (exceção para HGH), antes efetuada pela CEME por intermédio da Direção Geral, passou a ser feita diretamente no mercado nacional pelas Superintendências Regionais. Somente os medicamentos excepcionais importados continuaram a ser solicitados à Direção Geral. Para estes (importados), seria exigido "Termo de Conhecimento de Risco" assinado pelo médico e paciente e avaliação da solicitação por especialista do INAMPS.

As Superintendências Regionais passaram a ter autonomia para estabelecer programas de utilização de medicamentos excepcionais de acordo com peculiaridades epidemiológicas, desde que publicados em Boletins de Serviço e comunicados à Coordenadoria de Administração de Atividades de Farmácia, Comissão Regional de Farmácia e Terapêutica e à Equipe de Farmácia. Esta OS regulamenta a operacionalização, desde a solicitação até a entrega do medicamento excepcional ao paciente.

Em agosto de 1987, pela OS/INAMPS nº 138, é autorizado o pagamento da Ciclosporina utilizada no tratamento hospitalar e ambulatorial dos doentes transplantados e outras patologias cardíacas, atendidos em hospitais de Referência I e II, participantes do Sistema Integrado de Doenças Cardiovasculares do Sistema Integrado de Assistência ao Renal Crônico e Transplante Renal (SIRCTRANS).

Em dezembro do mesmo ano, através da Portaria nº 1.621 e OS nº 153 do INAMPS, é constituída comissão com o objetivo de restabelecer diretrizes, estabelecidas em 1982, no sentido de coordenar e instituir normas para execução do tratamento com HGH. Foram estabelecidos modelos de formulário, anamnese, exigências de exames, protocolo de tratamento e centros de referência em 21 capitais.

Durante o ano de 1988 diversos decretos possibilitaram a implantação e implementação do SUDS (Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde), inclusive, a Portaria MPAS/GM nº 4.370/88 estabeleceu normas para o seu funcionamento e desenvolvimento. Nesta portaria estava prevista a reorganização das estruturas administrativas das SES, para viabilizar a absorção das atividades de execução dos serviços das superintendências regionais, incluídas as atividades de suprimento de medicamentos para os estados, cujas programações seriam aprovadas pelas Comissões Intergestoras de Saúde. As CDMs passaram a ser incorporadas pelas congêneres dos estados.

Para 1989 os recursos para aquisição de órteses, próteses e materiais especiais (entre eles, alguns medicamentos e hemoderivados) passam a ser programados pelas SES, mas permanecem alocados na Direção Geral do INAMPS para aquisição direta, conforme normas em vigor. O pagamento era feito de acordo com a Tabela Nacional de Preços para Relação de Órteses, Próteses e Materiais Especiais (TNP/ROPM), através do sistema de Guia de Autorização de Pagamento/Autorização de Internação Hospitalar (GAP/AIH). Posteriormente, em 1993, a aquisição de medicamentos excepcionais passa a ser feita dentro desse programa, por não possuir programa específico.

Em março de 1990 são extintos os escritórios regionais do INAMPS, posteriormente substituídos pelas coordenadorias de cooperação técnica. Através da Portaria MS/SNAS nº 01/90, são aprovados valores de remuneração de serviços médicos assistenciais, inclusive medicamentos em geral e para hemodiálise.

Com a passagem do INAMPS do MPAS para o MS (1990), aos poucos, todo o aparato do programa de assistência farmacêutica foi sendo descentralizado para os estados, culminando com a extinção da Coordenadoria de Assistência Farmacêutica, em nível nacional, e das estruturas congêneres, em nível regional, representadas pelas CDMs e Chefias de Equipes entre 1991/1992, sendo finalmente, em 1993, extinto o próprio INAMPS. Assim, a responsabilidade pelos programas de assistência desenvolvidos passaram para a esfera estadual e, em nível federal, ficaram sob a responsabilidade das coordenações dos programas verticalizados do MS (Wilken & Bermudez, 1999: 22).

Foi tudo muito difícil. Primeiro, porque a Secretaria de Saúde não estava habituada a trabalhar com esse tipo de medicamento... era uma tradição do ex-INAMPS. Se bem que naquela época o número de pacientes transplantados e renais crônicos era bem menor (...). Então, como o tratamento não podia ser interrompido, a secretaria continuou atendendo, comprando. Foi um avanço, foi uma conquista colocar no SIA/SUS, que já era um sistema. (Entrevista 5).

A descentralização do fornecimento de medicamentos e materiais, entre eles órteses e próteses para as SES, foi estabelecida pela Resolução INAMPS nº 265/91, que definia a data limite de 01/06/91 para esta transferência, recomendando que as SES se articulassem com a CEME para aquisição dos produtos.

Quando o programa (excepcionais) foi repassado para as SES, mais ou menos 1992, não havia intenção de ressarcimento pelo Ministério da Saúde, então deu-se o hiato no programa, pois as SES não deram conta da demanda, na época. Entre 1990 e 1994 é que houve esse hiato em que foi repassada essa aquisição de medicamentos excepcionais, como um programa que as secretarias deveriam dar continuidade. E as dificuldades existentes pelas secretarias era falta de recursos financeiros. As secretarias não tiveram condições de manter, inclusive, pelo fato de muitos medicamentos serem importados. Na época, a importação desses medicamentos era muito difícil (Entrevista 2).

Em outubro de 1993, os medicamentos excepcionais para transplantados e renais crônicos, Ciclosporina e Eritropoietina Humana, são incluídos na tabela de valores dos procedimentos do Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde (SIA/SUS) e divulgados seus valores na Portaria MS/SAS nº 142. Complementando, através do ofício circular nº 418, a SAS informa sobre a Portaria nº 142 e relaciona os outros medicamentos que continuam a ser pagos por GAP (13 substâncias ativas em 22 apresentações). Havia, portanto, 15 substâncias padronizadas, em 31 apresentações.

A SAS, em janeiro de 1994, pela Portaria nº 7 altera os códigos de atividades profissionais na Ficha de Cadastro Ambulatorial (FCA) dos medicamentos Ciclosporina e Eritropoietina.

Em 1994 houve o retorno com a Portaria MS/SAS nº 32, dentro do programa GAP, a partir das solicitações das SES, de associações e de pacientes (Entrevista 2).

A Portaria MS/SAS nº 32/94 determinou, em caráter provisório, a emissão de GAPs para cobrança de despesas com Diálise Peritoneal Ambulatorial Contínua (CAPD), Tratamento Fora do Domicílio (TFD) e medicamentos excepcionais (25 apresentações de medicamentos), exceto aqueles incluídos no SIA/SUS. A relação total de medicamentos excepcionais permanece composta de 15 substâncias, em 31 apresentações.

Devido ao alto custo e questões orçamentárias o quantitativo de medicamentos adquiridos era insuficiente para as demandas. Por exemplo, em Minas Gerais a Coordenadoria de Assistência Farmacêutica, através do memorando 85/94, solicitava, no caso de Eritropoietina, a seleção de pacientes a serem atendidos, priorizando aqueles cujas condições clínicas exigiam o uso imediato do medicamento.

Em dezembro de 1993, a SAS editou a Portaria nº 177, aprovando novo modelo de Ficha de Cadastro Ambulatorial (FCA) e tabelas para adequação do banco de dados do SIA/SUS. Nesta portaria foram criados códigos para Serviço de Farmácia, classificação 06 G - código 29, e atividade profissional Farmacêutico, código 65. Estabelecia a produção de abril/94 como início de implantação com os novos procedimentos. Entretanto, devido às dificuldades de implantação, o prazo de execução desta portaria foi prorrogado por duas vezes. Primeiro para junho/94, pela Portaria 39/94, e para agosto/94, pela Portaria 89/94, passando a ser realmente operacionalizada através da Portaria no 133, de agosto de 1994.

Através da Portaria MS/SAS nº 76, de 11 de maio de 1994, são aprovadas instruções e fluxo de GAP, mantendo as disposições da portaria nº 32/94. São estabelecidos, entre outros, relação e códigos para os medicamentos (25 itens) a serem pagos por GAP.

Essa relação de medicamentos, segundo funcionário da SAS, foi estabelecida pela CODEC a partir de uma série histórica de consumo.

Nós fizemos um levantamento daquilo que estava sendo usado na época, que havia sido comprado. Na época então, nós fizemos uma relação que ficou contida nessa Portaria 76.

Foi feito pelo SIA, pela CODEC, já levando em conta uma série histórica do que estava sendo adquirido. A partir desse momento, em que o medicamento entrou nesse fluxo GAP, facilitou às secretarias fazerem sua aquisição e em contrapartida elas ganharam experiência.

Foi em 1990 com a Lei 8.080 que implantou a descentralização da saúde no Brasil. Nessa época começou a surgir o sistema de informação ambulatorial, pois, até então, não se tinha nenhuma informação do que acontecia no ambulatório. Havia informação hospitalar, em função da AIH, mas nenhuma informação do que ocorria dentro da área ambulatorial. Havia parâmetros, a partir da Portaria 3.046, antigo INAMPS, de 1983 (Entrevista 2).

Finalmente, pela Portaria nº 133, de 09 de agosto de 1994, é aprovado o novo modelo da FCA do sistema de informações SIA/SUS e tabelas a serem utilizadas a partir da produção de outubro/94. Esta portaria, além dos códigos já previstos na Portaria nº 177, incluiu em Tipos de Unidades a Farmácia de Dispensação com o código 43, que foi alterado para Farmácia de Dispensação de Medicamentos pela Portaria nº 216/94, somente quando a Farmácia não fizesse parte de Unidade Prestadora de Serviço

Com a Portaria nº 133, foi criado o Serviço de Farmácia, iniciando um trabalho para colocar os medicamentos na Tabela SIA/SUS. A importância, na época, dessa portaria foi o surgimento do Serviço de Farmácia na FCA - Ficha de Cadastro Ambulatorial - em que se exigia a presença da Farmácia e do farmacêutico, especificada no formulário, no campo de Atividade Profissional. Em função disso na FPO - Ficha de Programação Orçamentária -, dentro do SIA/SUS, criou-se o item de programação 18 (órteses e próteses, e assistência farmacêutica).

Passados alguns meses, por necessidade de se saber os gastos com medicamentos excepcionais, criou-se o item de programação 04 - Assistência farmacêutica - medicamentos excepcionais (Entrevista 2).

Nesse período grupos de portadores de doenças, por uma maior consciência política, informação, ou mesmo por solidariedade, se mobilizavam para manutenção e inclusão de medicamentos de seus interesses, como, por exemplo, o caso dos renais crônicos e portadores da Doença de Gaucher.

Essa associação [ADRETERJ] foi fundada há 14 anos. A associação surge da seguinte maneira: da insatisfação dos pacientes quanto ao tratamento que lhes é dispensado. Sempre tem dois ou três que se insurgem no grupo e falam. Não têm medo. Porque o maior problema do paciente é você denunciar (Entrevista 8).

Em 1992 eu ganhei uma causa na justiça e a partir daí resolvi formar uma associação (em 1994), de livre e espontânea vontade, para poder ajudar aos outros a se tratarem assim como eu tive a oportunidade e consegui legalmente para meu filho. A principal atividade da associação, e eu acho que a mais importante, é conseguir com que todos os doentes sejam tratados (Entrevista 7).

Eu tenho uma parcela de culpa nisso (...) começou com Hormônio do Crescimento. Um pedia para o governador, outro pedia para o deputado. Então eu comecei a dizer a eles [pacientes] que se organizassem. Porque senão, o que adianta? Você vai ao governador, você pede para você, e os outros? Não se preocupa com os outros? (...) Então começaram a surgir as associações (Entrevista 5).

Em junho de 1995 é incluído na relação de medicamentos excepcionais o medicamento Alglucerase (Ceradaseâ ), para uso na doença de Gaucher, sob custeio das SES.

Cabe ressaltar que, enquanto os medicamentos excepcionais eram definidos por um órgão do ministério (SAS), as outras questões de medicamentos, no país, passavam por discussões em comissões formadas com representantes dos variados grupos de interesses a elas relacionados. Podem ser exemplos: o grupo de trabalho sob a coordenação da DIMED, para propor regulamentação do uso e comercialização de medicamentos importados no país, onde estavam presentes representantes do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor-IDEC, ABIFARMA, Associação Brasileira de Médicos Assessores da Indústria Farmacêutica-ABIMAIF, Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais-ALANAC, Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica-ABIQUIF, DETEN/SVS/MS, DETEC/SVS/MS, Comissão Técnica de Assessoramento em Assuntos de Medicamentos e Correlatos-CRAME, Conselho Federal de Medicina-CFM, Conselho Federal de Farmácia-CFF (Port.MS/SUS 65/95), e a Comissão Permanente composta de representantes de órgãos do MS e Associação de Laboratórios Farmacêuticos Oficiais do Brasil (ALFOB) para acompanhar o planejamento de medicamentos para os programas do ministério (Port. MS/GM 2.008/95). Apesar dessas comissões, não se discutia a possibilidade de produção de medicamentos órfãos pelos laboratórios oficiais do país.

Em setembro de 1995, pela Portaria SAS nº 102, é padronizada nova relação de medicamentos excepcionais a serem pagos através de GAP, com 20 substâncias ativas, em 27 apresentações, onde se substitui o Leuprolide, que é exclusivo, por análogos do LH-RH(4), abrindo espaço para mais dois similares: a Goserrelina e a Triptorrelina; retira uma apresentação de Leuprolide, duas de Calcitonina injetável e Somatrofina de 12 UI; e inclui Enzima pancreática, Eritropoietina humana 10.000 UI, Molgramostima e Toxina tipo A de Clostridrium botulinum. Incluídos os medicamentos sob sistema SIA/SUS, a relação fica alterada para 22 substâncias em 33 apresentações.

Cabe ressaltar que cada medicamento gera um processo individual, independente se para o mesmo paciente.

As SES têm autonomia para estabelecer seu protocolo de uso de medicamento. Por exemplo: a partir do estudo multicêntrico mineiro de Eritropoietina, realizado em 1994, foi estabelecido o protocolo de uso desse medicamento a partir de novembro/95, em Minas Gerais. No Rio de Janeiro foram estabelecidos protocolo e receituário padrão em agosto de 1997.

Através das Portarias Ministeriais nos 2.042 e 2.043, de outubro de 1996, na área de Terapia Renal Substitutiva, é implantado Regulamento Técnico para os serviços e o sistema de Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade/Custo (APAC), inclusive medicamentos excepcionais, respectivamente. A portaria nº 2.043 só foi implantada na competência de abril/97, conforme prorrogação de prazo definida na Portaria GM nº 149/97, devido à necessidade de treinamento.

Na definição dessas Portarias houve a participação de representantes dos grupos de renais crônicos, inclusive para inclusão de medicamentos.

Quando nós negociamos a questão da Portaria 2.042, nós pedimos para incluir o Calcigexâ , uma forma de apresentação da Vitamina D3, que é injetável, do laboratório Abbott, e nós pedimos para incluir esse medicamento, porque não tinha código, ainda (Entrevista 9).

A SAS implantou formulários e regulamentou suas utilizações para atender as determinações anteriores através da Portaria MS/SAS nº 205/96. Esses formulários de autorização e cobrança de procedimentos ambulatoriais de alta complexidade/custo e fornecimento de medicamentos excepcionais a pacientes em Terapia Renal Substitutiva - TRS através de APAC são previamente numerados e devem conter identificação do paciente pelo Cadastro de Pessoa Física (CPF/CIC).

Essa portaria (nº 205) estabelece, ainda, o quantitativo máximo mensal dos medicamentos autorizados por paciente em TRS e sua cobrança em APAC, cuja validade é de três meses. Para demais receptores de transplante (coração etc.) a cobrança deve ser através de Boletim de Procedimento Ambulatorial (BPA).

Apesar de envolver imenso trabalho administrativo, esta sistemática permite um maior controle sobre a utilização dos medicamentos.

Novembro de 1996 pode ser considerado um novo marco para o programa. Através da Portaria MS/SAS nº 204, de 06 de novembro, são estabelecidas medidas para maior controle dos gastos com medicamentos excepcionais e é complementada a relação de medicamentos excepcionais.

Esta portaria é muito importante, do ponto de vista operacional e do controle, pois cria códigos na tabela do SIA/SUS para informatização e retira do código provisório de órtese e prótese os medicamentos Ciclosporina e Eritropoietina; estabelece a obrigatoriedade de dispensação, somente no serviço público; institui formulário de Solicitação de Medicamentos Excepcionais (SME) e determina que a partir de janeiro de 1997 a cobrança passe a ser feita através de BPA, excluindo do programa GAP. Segundo funcionário da SAS, por observação do consumo histórico, a nova relação de medicamentos, passa a conter 32 substâncias ativas em 53 apresentações. Os valores para esses medicamentos são fixados pela Portaria MS/SAS nº 235 de dezembro de 1996.

Interessante observar que enquanto essas medidas são tomadas pela SAS, a CEME, pertencendo ao mesmo MS, cria Comissão Multidisciplinar composta por seis representantes da CEME e um do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS), do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS), da Secretaria de Vigilância Sanitária/MS, do Conselho Federal de Farmácia (CFF), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da OPAS. Estabelece, também, o prazo de 90 dias para a comissão apresentar ao Conselho Consultivo da CEME análise e atualização da RENAME, dentro dos critérios da OPAS. (Portaria MS/CEME n.º 045/96, de 06/11/96).

Em janeiro de 1997, a Portaria MS/SAS nº 17 inclui na relação de medicamentos excepcionais, medicamentos para Esclerose Múltipla; exclui e altera códigos, apresentações e denominações para a substância ativa Interferon. A relação passa a conter 34 substâncias e 56 apresentações.

A fim de ilustrar, mais uma vez, o isolamento quanto às decisões do programa de medicamentos excepcionais, podemos citar: 1) Portaria MS/GM nº 81 de 22/01/1997, que altera a composição da Comissão Permanente de Medicamentos, com representantes da CEME; Programas específicos do MS, da Fundação Nacional de Saúde, da SAS, da Secretaria Executiva/MS; ALFOB; CONASS e CONASEMS para implementação/acompanhamento da Política de Assistência Farmacêutica Governamental e faz recomendações para os níveis estadual e municipal; 2) Resolução MS/CNS n.º 216 de 06/03/1997, em que o Ministro homologa a presente resolução que propõe a reinclusão do IDEC e Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentoss (SOBRAVIME) na Comissão de Assessoramento para Assuntos de Medicamentos em espaços deliberativos e consultivos dos órgãos de vigilância sanitária e 3) Resolução CNS nº 227, de 08/05/1997, que aprova a realização de oficina de trabalho, com o objetivo de discutir e formular estratégias e mecanismos para a implementação de política de medicamentos genéricos no país, com participação de setores governamentais e diversos grupos de interesses envolvidos na questão de medicamentos.

Excluídos os medicamentos excepcionais, independente dos aspectos envolvidos, fato é que, havia abertura para participação de vários atores nas diversas discussões da política de medicamentos, no país.

Em julho de 1997, é desativada a CEME (Decreto nº 2.283) e, pela Portaria MS/SPSA nº 02, é instituído grupo assessor, transitório, para condução de proposta da política de medicamentos.

Em 11 de setembro de 1997, em encontro realizado em Fortaleza, como tantos outros patrocinados por indústria farmacêutica, foi discutida a lista de medicamentos constantes da Portaria nº 204/96, em vigor, naquela ocasião (Entrevista 6), e através de votação aberta, resultando 13 votos a favor e 05 contra, foi decidida a inclusão na portaria de: Anfotericina Lipossomal e Acitretina (Neo Tigasonâ ), substituída a Calcitonina de 50 UI (vários fabricantes) por Calcitonina de 200 UI (Miacalcicâ ) e excluído o Etretinato (Tigasonâ ).

Ficaram para comprovação de estudos dentro de critérios da OMS, no processo de seleção, inclusão, exclusão e substituição de medicamentos, sugeridos por representante da OPAS, naquele evento, e encaminhamento ao MS os seguintes medicamentos: Micofenolato de 500 mg (Cellceptâ ), Cladribina (Leustatinâ ), Bifosfonato (Alendronato) e o Palmidronato de Sódio (Arediaâ ). Ficou decidido, ainda, o prazo de 90 dias para solicitações de inclusões, exclusões e/ou substituições de medicamentos na portaria.

Em março de 1998, através da Portaria nº 23, a SAS substitui o medicamento Alglucerase 400 UI por Imiglucerase 200 UI, devido à retirada do mercado e substituição pelo mesmo laboratório produtor. Esta portaria também autoriza os serviços de farmácia dos hospitais universitários a dispensarem medicamentos excepcionais e fixa valores para parte desses medicamentos.

Interessante observar a falta de critérios, normas ou uniformidade de procedimento, pois o mesmo se deu com o medicamento Etretinato e Acitretina, porém não houve a oficialização por ato específico. Outro exemplo foi a orientação da SES/MG, através de memorando de 24/03/98, informando que poderiam ser atendidos pedidos de medicamentos de médicos particulares devido às dificuldades de consultas com especialistas na rede do SUS. Esta liberação se deu por resposta informal de funcionário do MS. Assim, ficava dispensando CGC do paciente e código da unidade no SIA/SUS.

Extinta a CEME é emitida portaria ministerial nº 2.775 de 14 de maio de 1998, que subordina à Secretaria Executiva as ações de planejamento e programação de medicamentos cujas atividades serão exercidas por um Diretor de Programa e cria também a Coordenação de Planejamento e Programação de Medicamentos e Coordenação de Distribuição e Armazenagem de Medicamentos. A aquisição dos medicamentos fica sob responsabilidade da Subsecretaria de Assuntos Administrativos e a elaboração da relação e dos quantitativos de medicamentos a serem adquiridos ficam na competência da SPS.

Os medicamentos Excepcionais permanecem na SAS, que em junho fixa novos valores para tabela SIA/SUS a partir de julho/98.

Em julho de 1998, o Ministro da Saúde determina que a SPS institua comitês técnico-científicos, de acordo com as áreas técnicas, para dar suporte à elaboração de programas, projetos e formulação de normas, orientações e instruções para desenvolvimento e acompanhamento.

A SAS estende a utilização do medicamento Ciclosporina (imunossupressor utilizado em receptores de transplantes) para uso dermatológico, em patologias que não respondam ao tratamento convencional.

Em setembro do mesmo ano, através da Portaria nº 142, a SAS inclui na relação de medicamentos excepcionais os medicamentos utilizados em TRS: Alfacalcidol 0,25 mcg, 1 mcg e Micofenolato Mofetil 500 mg, comprimidos, similares de outros já padronizados, fixando quantitativos por pacientes/mês e valores do SIA/SUS.

Ainda, em setembro, por ato ministerial, a área técnica de assistência farmacêutica fica subordinada ao Departamento de Gestão de Políticas Estratégicas da Secretaria de Políticas de Saúde. As atividades passam a ser desenvolvidas por um Comitê Técnico-Científico (CTC).

Também por ato ministerial, é regulamentada a utilização de APAC na sistemática de autorização e cobrança na área do câncer. Esta portaria (nº3.536/98) inclui no valor do procedimento os gastos com medicamentos utilizados em concomitância à quimioterapia, entre eles alguns cobrados como excepcionais. Posteriormente, a SAS estabelece que os medicamentos excepcionais utilizados em neoplasias não serão mais cobrados por BPA ou APAC. Os medicamentos excepcionais Ciproterona, Goserrelina, Triptorrelina, Leuprolide, Interferon, Molgramostima e Filgrastima passam a ser cobrados por BPA e Eritropoietina pode ser cobrada por BPA OU APAC-TRS (Portaria nº 184/98). Em final de outubro, são aprovadas instruções para controle informatizado da produção ambulatorial através de APAC-II meio magnético.

Estas providências são muito importantes como definidoras e controladoras do programa de medicamentos excepcionais, pois o consumo concomitante por pacientes da área oncológica não permite conhecer, exatamente, o volume de recursos utilizados em doenças raras, que são a justificativa do referido programa.

Conforme já apresentada no Capítulo III, em outubro de 1998, é aprovada a Política Nacional de Medicamentos, que em suas diretrizes estabelece a reorientação da assistência farmacêutica, aí incluída a garantia do acesso da população aos medicamentos de custos elevados para doenças de caráter individual.

O início do ano de 1999 traz novos valores para os medicamentos excepcionais. A SAS, em janeiro e março, fixa, por portarias, valores para vigorarem a partir de fevereiro e abril, respectivamente.

Em março são estabelecidos critérios e requisitos para qualificação dos municípios e estados ao incentivo à Assistência Farmacêutica Básica e definidos os valores a serem transferidos, Fundo-a-Fundo. Serão aportados pelo ministério R$159.636.413,00, correspondente à população estimada para o ano de 1997, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE (Portaria MS/GM nº 176/99).

Nessa época, a Portaria Ministerial nº 254 determina que os gestores do SUS elaborem programação físico-financeira anual de medicamentos excepcionais para a completa cobertura da demanda. Cabe ressaltar que os valores para a programação são os estabelecidos pela SAS a partir de abril e as aquisições no mercado privado, pelas SES, não seguem o mesmo preço, levando a uma defasagem de preços no ressarcimento pelo MS. A conseqüência disso é a cobertura das diferenças pelas SES, ou falta de medicamentos.

Tenho 9.000 pacientes e o volume de gasto mensal com esses pacientes é de R$ 500,00, per capita. (...) A tabela do Ministério da Saúde é menor que a tabela de preço do mercado, em alguns casos , então o que se gasta é muito mais... (Entrevista 4).

O Estado antecipa o pagamento, depois é que vem o ressarcimento. Depois que se produz o serviço é que o Ministério da Saúde paga... Esse é um problema concreto. Se não apresentar APAC e BPA o Ministério não paga. O recurso não paga nem o que se compra. Então, se a SES não tem um capital inicial para investir, não compra (Entrevista 6).

A falta constante desses medicamentos tem sido um transtorno e muito sofrimento para os pacientes. Em alguns estados a situação é mais crítica devido a questões de gerenciamento. O início do ano de 1999 foi marcante, pois a mudança de governos estaduais, reorganização nos diversos níveis hierárquicos, falta de estoques de reserva e dependência da aprovação de orçamentos gerou um aumento nas pressões por grupos de portadores de doenças, sendo esta situação assunto diário dos noticiários locais e nacional. Tal foi a situação, que um dos maiores noticiários de veiculação noturna ensinou passo a passo o caminho para abertura de processo para o recebimento de medicamentos excepcionais.

O fato desses medicamentos serem ditos para doenças raras pode levar à subestimar o número de pacientes atendidos pelo programa. Citando apenas os renais crônicos, existe, hoje, no Brasil, cerca de 42.000 pacientes em hemodiálise e 2.200 transplantados, segundo a FARBRA.

Em 20 de abril de 1999, a SAS estabelece várias normas e instruções para controle de medicamentos excepcionais, emissão de APACs e BPAs magnéticos e mantém alguns formulários/instrumentos para cobrança ambulatorial de TRS. Estabelece, ainda, a utilização exclusiva de Ciclosporina para receptores de transplante, revogando a decisão de extensão de seu uso, de julho/98 (Portarias nºs 137 a 140/99).

Em 30 de abril são definidos os recursos federais anuais para financiamento das ações e serviços de saúde, inclusive os recursos para Assistência Farmacêutica Básica que são de R$ 161.790.311,00. Esta é a parte do MS calculada a partir de R$1,00 por habitante. Quanto aos recursos para medicamentos excepcionais estão incluídos na Assistência Ambulatorial Média, Alta Complexidade e Hospitalar (portaria GM, nº 531). Na distribuição desses recursos feita pela SAS, pela portaria nº184, fica definido o limite para medicamentos excepcionais em R$ 206.357.476,00.

Em maio de 1999 é publicada a revisão RENAME. Foram incluídos nesta RENAME os seguintes medicamentos excepcionais nas respectivas classificações:

Metilprednisolona - pó p/ sol. inj. 500 mg - Imunomoduladores.

Sulfasalazina - com. 500 mg - Sulfas e Anti-sépticos urinários.

Leuprorrelina - sol. inj. 3,75 mg/ml - Hormônios Hipofisários e correlatos.

Ciclosporina - cáp. 25, 50 e 100 mg e sol.oral 100mg/ml- Imunomoduladores.

Imunoglobulina Humana I.V. - 500 mg; 1,0; 2,5; 3,0; 5,0 ou 6,0 g - Soros e Imunoglobulinas.

Deferoxamina - pó p/inj. 500 mg - Antídoto específico em intoxicações exógenas.

Penicilamina - cáp. 250 mg - Antídoto específico em intoxicações exógenas.

Calcitriol - cáp. 0,25 mcg e sol.inj. 1 mcg/ml - Vitaminas e Minerais.

Ferrodextrano - sol. inj. 50 mg Fe(I)/ml - Antianêmicos.

Epoetina Hum. Rec. - sol. inj. 1.000, 2.000, 3.000, 4.000 e 10.000 UI/ml - Antianêmicos.

Desmopressina - sol. intranasal 0,1 mg/ ml - Hormônios hipofisários e correlatos.

Somatropina - sol. inj. 4 UI/ml - Hormônios hipofisários e correlatos.

Segundo funcionário da CODEC/SAS, houve um pedido seu, à SPS, na época da revisão, para inclusão de todos os medicamentos excepcionais na RENAME, a exemplo da Somatropina e Sulfasalazina que já estavam na relação. Os critérios para estarem na RENAME ou na relação de excepcionais é que não estão claros. A Desmopressina, por exemplo, era fabricada pela FURP, laboratório oficial do governo de São Paulo, podendo, portanto, já estar na RENAME por atender a um dos quesitos mais importantes que é a fabricação no país. Entretanto, havia SES que desconhecia essa produção, e permanecia adquirindo no mercado privado, como exclusividade.

A discussão atual de uma política de medicamentos para o país, revisão da RENAME, e a explosão, neste momento, das questões que envolvem os medicamentos, quais sejam, fraudes, qualidade, genéricos, similares, preços, mercado, corrupção, interesses torna muito oportuno um olhar mais profundo, dos dirigentes, para os medicamentos de alto custo ou excepcionais. Vale lembrar, a falsificação, amplamente divulgada na imprensa, do medicamento Ciproterona, que abreviou a vida de pacientes portadores de câncer de próstata.

(...) eles fogem, na grande maioria, à primeira questão que é de serem uma consolidação na clínica. Em geral, são aqueles medicamentos de lançamento, exceto alguns mais antigos. É o caso, por exemplo dos transplantados, dos medicamentos de controle da rejeição de órgãos transplantados, da osteoporose que, hoje, sabe-se que atinge determinada faixa etária, um grupo já não tão diferenciado, já é um grupo maior.

No geral, são medicamentos muito novos. Cada vez mais nota-se novos grupos que não estavam fazendo parte do programa que se reúnem em associações para defesa de seus direitos. São portadores de algumas patologias e começam a reivindicar o tratamento, em geral de longo prazo ou contínuo, caro, muito caro. Por exemplo, hoje temos grupos dos portadores de Esclerose Múltipla que estão fazendo uma pressão muito grande para novos produtos (...) Esclerose Lateral Amiotrófica e assim por diante. Os portadores de Hepatite C começam a ser um grupo bastante representativo, não é uma coisa mais escassa no nosso meio. (...) Por outro lado fica-se quase que restringindo ou garantindo alguns mercados. Veja, por exemplo, também, o caso dos antipsicóticos. Agora será mais um, mas nós temos dois antipsicóticos de alto custo. Eu acho, enfim, hoje, que deva ser debatido que tipo de situação se configura como para dispensação excepcional (Entrevista 3).

É essa falta de critérios e suas conseqüências que instiga uma busca da compreensão de como se decidem algumas políticas públicas.

Cabe ressaltar que a inclusão desses medicamentos, considerados excepcionais, na RENAME, em nada alterou seu mecanismo de aquisição, dispensação e/ou financiamento. Ainda, em maio, através da Portaria Conjunta MS/SE/SAS nº4, fica estabelecida a programação do limite de recursos anuais destinados ao custeio da assistência ambulatorial, de média e alta complexidade, e hospitalar e dos tetos financeiros federais para atenção básica/1999.

Em junho e julho, algumas portarias conjuntas SE/SAS vão tratar dos recursos financeiros para medicamentos para transplantados: a Portaria nº 10 determina que a partir de junho de 1999 a produção ambulatorial de medicamentos excepcionais (imunossupressores utilizados em TRS) seja financiada com recursos do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC), nos limites de R$60.000.000,00. Esse valor foi alterado, pela Portaria nº14, para R$90.000.000,00, elevando esses limites para o total de R$ 296.357.476,00.

A Portaria Conjunta nº 16, de julho de 1999, que regulamenta o financiamento e a distribuição de recursos do FAEC, para execução das atividades assistenciais inerentes ao Sistema Nacional de Transplantes, prevê que a dotação orçamentária dos estados será onerada caso ultrapassem os limites. Os recursos para medicamentos representam 51,4% do total desta portaria.

A SAS, através da portaria nº 409, implanta a sistemática de APAC para o fornecimento de todos os medicamentos excepcionais. Esta portaria estabelece os procedimentos para fornecimento dos referidos medicamentos, controle individualizado dos pacientes através de CPF, Classificação Internacional de Doenças (CID), quantidades máximas de medicamentos e outros procedimentos.

Isto é um avanço muito importante no controle dos gastos, todavia, há que se ter um bom investimento em recursos humanos, pois aumenta substancialmente o volume de trabalho administrativo, sob o risco de haver um número enorme de rejeição do sistema informatizado decorrente de erros de preenchimento de APACs.

Ainda em agosto, são estabelecidos procedimentos e novos códigos para medicamentos pós-transplantes.

Até aqui, não existem normas específicas para inclusão de medicamentos na relação de excepcionais. As portarias não explicitam os processos que levaram às tomadas de decisões.

Pela primeira vez é apresentada consultoria responsável pela inclusão de medicamentos na relação de excepcionais. Trata-se da Portaria Conjunta MS/SE/SAS nº 27, que inclui na Relação de Medicamentos Excepcionais, conforme sugestão do Grupo de Assessoramento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes, os seguintes medicamentos: Ciclosporina 10mg, cápsula, Tacrolimus 1 mg e 5 mg, cápsulas. Esta portaria também define a participação financeira do MS quando dispensados a pacientes transplantados.

Através da Portaria SAS nº 562 são incluídos na tabela do SIA/SUS os medicamentos Olanzapina de 5 e 10 mg, comprimidos, e Risperidona de 1 e 2 mg, comprimidos (estes já constantes da lista de excepcionais desde a Portaria 204/96). Esta portaria demonstra o conflito no caráter do programa, pois o CTC da área de saúde mental ratifica a excepcionalidade, apenas, do medicamento Clozapina 100 mg, comprimido, inclui similares, com a justificativa de redução de efeitos colaterais, deixando transparecer um "mal-estar" de mercado, a ser resolvido pelos gestores estaduais e municipais, sob aprovação da CIB-Comissão Intergestores Bipartite.

Em outubro é implantada no SIA/SUS a tabela de procedimentos com oito dígitos a ser utilizada a partir de novembro, ficando os medicamentos com o código 36 e 26 subgrupos (Portaria MS/GM nº 1.230 de 14/10/1999).

Finalmente, através da Portaria MS/GM nº 1.310, de 28 de outubro de 1999, é criada a Comissão de Assessoria Farmacêutica à SAS, composta por 10 representantes, sendo: da SAS(2), SPS(2), SE (1), ANVS (1), CONASS (3) e CONASEMS (1). A finalidade da comissão é estabelecer critérios para seleção, inclusão, exclusão e substituição de medicamentos excepcionais na tabela SIA/SUS.

A partir desse momento, os atos relacionados a medicamentos excepcionais já começam a passar por análise da comissão. Assim, a Portaria GM/MS nº 1.464 cria o subgrupo 28 Antivirais, no grupo de medicamentos do SIA/SUS, e inclui na relação de medicamentos excepcionais, conforme estudos realizados pela comissão de assistência farmacêutica, o medicamento Ribavirina 250 mg, comprimido, código 36.280.01-1. Estabelece, ainda, a exigência de dispensação associada ao Interferon Alfa, para Hepatite C. Em seguida, a Portaria SAS/MS nº 772 inclui na relação de medicamentos considerados excepcionais, conforme análise da Comissão de Assessoria Farmacêutica, o medicamento Acitretina 25 mg Cápsula, código 36.151.02-5, e pela Portaria conjunta SE/SAS/MS nº 55 é incluída, também, a Azatioprina de 50 mg, comprimido. Cabe destacar que a Azatioprina é um medicamento considerado essencial desde a primeira RMB (1976).

Referência

  • Silva, Regina Célia dos Santos. Medicamentos excepcionais no âmbito da assistência farmacêutica no Brasil. [Mestrado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública; 2000. 215 p.


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